A população mundial chegará a 8 bilhões de pessoas em 2022, agravando a pressão sobre os recursos naturais e tornando urgente a implementação de políticas globais que fomentem a economia circular e a redução da emissão dos gases de efeito estufa (GEE). Nesse cenário, os mercados de carbono vêm se consolidando como uma grande oportunidade de negócios para o século 21. Sim, a expressão deve ser utilizada no plural, como passamos a demonstrar brevemente.
Há os mercados de carbono voluntários e os regulados, em nível global, regional ou nacional. O mercado global foi criado pela United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC), em que cada país voluntariamente assumiu o compromisso de reduzir gradativamente as suas emissões até alcançar a neutralidade, através do Nationally Determined Contributions (NDC). A recente COP de Glasgow, ao regulamentar o artigo 6º do Acordo de Paris, deu um passo importante para a implementação de um novo e mais efetivo mercado mundial de carbono.
Regionalmente, destaca-se o mercado de carbono europeu (European Union Emissions Trading Scheme — Euets) e, nacionalmente, o recém-criado mercado chinês, com mais de 4 mil MtCO2e. Atualmente, apenas 16% das emissões de GEE no mundo são objeto de algum mercado regulado de carbono (que totalizavam 29 em 2021 – World Bank, 2021). Estima-se que a demanda voluntária global deverá crescer 15 vezes até 2030 e até 100 vezes até 2050 (Blaufelder, Levy, Pinner, 2021).
Ainda não há um mercado regulado de carbono no Brasil, ou seja, não há uma obrigação legal de metas para a redução de emissões de GEE. Contudo, há um crescente mercado voluntário formado por empresas que buscam reduzir ou neutralizar as suas emissões, inclusive para atender critérios ESG (Environmental, Social and Governance), visando obter vantagens competitivas — como integrar a cadeia de fornecedores para empresas localizadas em mercados regulados de carbono, obter linha de crédito especial etc. — bem como sinalizando ao público a sua estratégia de sustentabilidade, prevenindo riscos e assegurando maior resiliência à sua atividade. Paralelamente, o Brasil declarou que alcançará a neutralidade climática até 2050, o que também implicará a implementação de diversos programas governamentais, com ênfase em recuperação de pastagens degradadas (RPD), sistemas integrados de lavoura, pecuária e florestas (ILFP), reflorestamento, manejo florestal sustentável etc., no intuito de cumprir com a sua NDC. As iniciativas legislativas até o momento, todavia, ainda não tornaram a “floresta em pé”, via de regra, um ativo econômico a beneficiar o seu proprietário.
Em maio de 2022 foi promulgado o Decreto nº 11.075, que estabelece os procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas e institui o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Sinare). Os Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas definirão metas gradativas, mensuráveis e verificáveis, de redução de gases de efeito estufa (GEE) aplicáveis a diversos setores, tais como mineração, construção civil, energia elétrica, agropecuária, entre outros. Contudo, não há a indicação de metas e prazos específicos para redução de emissões de carbono nem tampouco os setores que estariam obrigados a cumpri-la.
O Projeto de Lei nº 528/2021, em tramitação na Câmara dos Deputados, pode se tornar o marco regulatório para o mercado de carbono no Brasil. Essa iniciativa prevê a criação do Sistema Nacional de Registro de Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SNRI-GEE), que trará credibilidade e segurança às transações, e que será administrado pelo Instituto Nacional de Registro de Dados Climáticos (INRDC). Haverá isenção dos tributos federais PIS, Cofins e CSLL nas transações nacionais realizadas por empresas no mercado voluntário de créditos de carbono. Caberá ao Ministério da Economia, no prazo de até 5 anos a partir de sua publicação, regulamentar o programa nacional obrigatório de compensação de emissões de GEE.
Concluindo, o Brasil deverá criar um mercado regulado de carbono, com sistema de cap and trade, com metas obrigatórias e incentivos à redução de emissões, ao tempo em que diversos programas do governo federal, destinados a alcançar a declarada meta de neutralidade até 2050, deverão também ser implementados, gerando novas oportunidades de negócios e evitando barreiras ambientais para suas exportações.
POR ANTÔNIO BELTRÃO – Advogado e mestre em direito ambiental pela Pace University School of Law, Nova York
Fonte: Correio Braziliense